Abertura do Agosto Lilás tem manifestação do delegado na Câmara de Vereadores

08/08/2023
(Foto: Divulgação / Câmara)

(Foto: Divulgação / Câmara)

Na noite desta segunda-feira (7), a Câmara de Vereadores de Dois Irmãos recebeu a primeira atividade da programação do Agosto Lilás, mês de conscientização pelo combate a qualquer tipo de violência contra a mulher. Claudete Fritzen, da Coordenadoria da Mulher do município, lembrou que neste 7 de agosto a Lei Maria da Penha completou 17 anos.

Na sequência o delegado Felipe Borba, da Polícia Civil de Dois Irmãos, falou sobre o tema “O Fenômeno da Violência de Gênero e a Relevância das Políticas Públicas Pertinentes”. Ele comentou que a concretização dos direitos das mulheres enfrenta vários obstáculos, entre eles o cultural e o econômico, e que é preciso uma atuação conjunta dos órgãos de apoio e da sociedade como um todo. Leia a seguir trechos da sua manifestação:

 

Obstáculo cultural

– Este, creio eu, seja o de mais difícil implementação, porque depende da absorção e da promoção de certos valores morais. E isso também se conquista muito através da educação, algo construído e passado de geração em geração. Não é incomum, na delegacia, nós nos depararmos com sujeitos que consideram normal a prática da violência doméstica familiar contra a mulher, porque isso aconteceu em relação a postura do seu pai, do seu avô, assim de maneira quase eternizada.

 

Obstáculo econômico

– Como o tema desta fala é implementação de políticas públicas, temos o obstáculo das condições financeiras por parte do Estado de executar as suas políticas; não basta somente ter vontade, é preciso destinar verbas. Em relação ao problema econômico, é importante dizer também que a dependência econômica das mulheres, tradicionalmente e historicamente nas relações, acaba prejudicando o enfrentamento destas situações, porque uma mulher que já está inferiorizada, humilhada, menosprezada, sem capacidade de resistir aos atos de violência de todos os tipos, é mais um fator que desestimula o combate, porque nós precisamos ter o conhecimento, e geralmente é um caso que acontece dentro do lar, na clandestinidade, sem testemunhas.

 

Resistências à Lei

– Ainda hoje percebemos resistências em relação a própria Lei Maria da Penha, alguns suscitando que não faz sentido um tratamento diferenciado, e também argumentos no sentido de que os assuntos de conflitos que geralmente acontecem no âmbito afetivo deveriam ser considerados de ordem privada, ou seja, que o Estado, a comunidade, as outras pessoas não deveriam interferir de qualquer maneira.

 

Fator alcoolismo e drogadição

– É muito comum o relato das mulheres comentando que o companheiro tem uma postura adequada, mas que, em razão da ingestão de bebidas alcoólicas em excesso ou até mesmo de drogas ilícitas, costuma descambar seu comportamento para atitudes violentas.

 

Grupos reflexivos

– Também lidamos comumente com nítidas dificuldades do companheiro ou ex-companheiro em lidar com o fim do relacionamento. Em relação a este ponto, aproveito para dizer que teve início em Dois Irmãos, numa parceria do município com o Poder Judiciário, os chamados grupos reflexivos, onde os homens que recebem uma medida protetiva decretada, ou seja, de afastamento do lar, de não se aproximar da vítima, também estão recebendo agora a ordem judicial de comparecer nestes encontros, onde vamos discutir o fenômeno da violência doméstica familiar contra a mulher como um todo, gerando reflexão e estimulando que aquele indivíduo modifique o seu padrão de comportamento.

 

Questão da ‘cifra oculta’

– Outro problema, que talvez seja o maior, é a questão da ‘cifra oculta’. Estima-se que muito menos do que 10% das mulheres que sofrem violência procuram algum tipo de auxílio. A maioria das mulheres que sofre violência doméstica familiar jamais busca qualquer tipo de auxílio. Temos que auxiliar, estimulando a comunicação para os órgãos policiais, ou nós mesmos, tomando conhecimento de que a nossa vizinha ou um familiar está sofrendo algum tipo de violência, comunicarmos o fato aos órgãos que estão vinculados a esta rede de apoio.

 

Preocupação com feminicídios

– Em relação a Polícia Civil, a nossa maior preocupação são os feminicídios. No Estado do Rio Grande do Sul, no primeiro semestre, tivemos 40 mulheres mortas neste contexto e mais 127 tentativas. Quando a gente pensa na vítima, temos que pensar que muitas destas mulheres são mães, e grande parte tem o conflito intensificado justamente porque muitas vezes existe a discussão em torno do convívio com os filhos. Essas 40 mulheres mortas deixaram mais de 70 filhos sem a mãe.

 

Eficácia de medidas protetivas

– Destas 40 mulheres, mais de 60% não tinham nenhuma ocorrência registrada contra o agressor. 80% das mulheres que foram efetivamente mortas não tinham uma medida protetiva em vigor no momento do ato. Isso demonstra que as medidas protetivas têm eficácia, que levar à Polícia Civil a comunicação de um fato com essa natureza faz diminuir as chances de um final extremamente trágico.

 

Números de Dois Irmãos

– Em Dois Irmãos, estamos há bastante tempo sem feminicídio consumado. Geralmente, temos 200 ocorrências de violência doméstica por ano na delegacia do município, cerca de 20 por mês, e encaminhamos cerca de 150 medidas protetivas por ano ao Poder Judiciário. Os casos mais recorrentes são ameaça, lesão corporal e descumprimento de medida protetiva. Neste ano já efetuamos a prisão de cinco indivíduos.

 

Contribuição de todos

– Temos muito caminho pela frente na busca pelo fim da discriminação contra as mulheres e, por consequência, o fim de atos violentos que tenham o gênero como causa. Um dia, isso ainda vai ser apenas uma curiosidade relatada em livros de história, e cabe a todos nós contribuir para que isso aconteça o mais rápido possível. Considero que nós já estamos no meio do caminho na busca desta alteração de padrões de comportamento do tipo violento, então não podemos desistir.

 

***

 

PRÓXIMAS ATIVIDADES DO AGOSTO LILÁS

No dia 15 (terça-feira), às 14h, tem roda de conversa com Maristela Malheiro Kohlrausch sobre “Trabalhabilidade: O que é e como aplicar”, no Instituto Olívia Fischer (Av. São Miguel, 939, Sala 1, Centro). Depois, no dia 28 (segunda-feira), às 14h30, ocorre bate-papo sobre violência doméstica com a soldado da Brigada Militar Andressa Bernardes, no Clube União (Avenida Porto Alegre, 2055, bairro União).


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