(Foto: Arquivo pessoal)
Para saber mais sobre o assunto levantado pela reportagem sobre cesáreas, a redação do JDI conversou com a médica Maristane Cortes de Mattos Strada, coordenadora de programas da Secretaria da Saúde de Dois Irmãos. Ela é graduada pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), com Residência Médica e Título de Especialista em Ginecologia e Obstetrícia pela Fundação Faculdade de Ciências Médicas de Porto Alegre (FFFCM), e Especialista em Saúde da Família pela Universidade do Estado do Rio Grande do Sul (UERGS). Confira:
Quais os prováveis motivos do percentual elevado de nascimentos por cesariana?
Dra. Maristane – O Brasil é o segundo país do mundo em número de cesarianas, em consequência disto o Ministério da Saúde e demais entidades médicas vêm realizando um trabalho, desde 2016, para diminuição destes índices. Dois Irmãos obviamente faz parte deste cenário, e seus indicadores refletem a realidade do país. Não obstante, observa-se no mundo uma tendência de elevação do número de cesarianas. Os elevados índices decorrem de múltiplos fatores, desde o medo da dor até questões históricas e culturais. Existe uma cultura de cesariana, que envolve todos os personagens, quer seja pacientes, familiares ou profissionais da saúde, que pouco a pouco, desde 2016, com legislações, recomendações e debates sobre o problema está se tentando modificar, porém as mudanças culturais são lentas. O mundo moderno requer fluidez, planejamento, controle; requisitos que uma cesariana pode oferecer em detrimento do parto que por ser fisiológico não é possível controlar, prever.
Hoje, falta paciência, resiliência, condições inexoráveis para aguardar o parto como um momento natural. Além disso, o próprio modelo assistencial também é voltado para cesariana, de modo que atualmente vários hospitais têm se preocupado com a ambiência para melhor acolher o parto, com espaços que propiciem a movimentação da gestante, a presença do acompanhante com conforto e mesas de parto mais adequadas ao procedimento. Na realidade local há um movimento no sentido de cumprir com as pactuações pela diminuição do número de cesarianas, nesse sentido a gestão municipal tornou o plantão obstétrico presencial e previu a construção de novas salas de pré-parto, parto e puerpério. Porém, devido à pandemia da Covid-19 não houve implementação das novas ambiências.
Quais as principais diferenças entre o parto normal e a cesariana, e em quais casos cada um deles é recomendado?
Dra. Maristane – O parto normal é um processo fisiológico para o nascimento enquanto a cesariana é um procedimento cirúrgico. A princípio, o parto normal estaria sempre recomendado salvo as contraindicações ao mesmo como apresentação fetal diversa da apresentação cefálica (Exemplo: bebê sentado cuja mãe não teve partos anteriormente), duas ou mais cesarianas anteriores (Exemplo: mãe possui dois filhos nascidos de cesariana e está grávida do terceiro filho), além de outras. É preciso considerar que durante o trabalho de parto podem aparecer intercorrências que indiquem cesariana (Exemplo: sofrimento fetal durante o trabalho de parto). É sempre importante realizar o pré-natal para acompanhar a gestação e discutir sobre o parto, assim como sanar dúvidas e desfazer os mitos e as fantasias. A Sociedade de Ginecologia e Obstetrícia do Rio Grande do Sul (SOGIRGS) disponibiliza vídeos explicativos sobre o parto no Youtube, basta buscar “Parto Seguro SOGIRGS” que aparecerá uma sequência de vídeos sobre o assunto.
O parto normal é melhor para a saúde do bebê e da mãe nos casos em que a cesariana não é necessária?
Dra. Maristane – O parto é um procedimento de baixa complexidade, enquanto a cesariana é um procedimento cirúrgico de média a alta complexidade, o que impacta de alguma forma na recuperação da mãe. Além disso, um procedimento cirúrgico oferece riscos como lesões de órgãos, infecção e hemorragia. Porém, apesar dos riscos, pode tornar-se extremamente benéfico em situações de necessidade. Outra questão está relacionada ao aleitamento materno, pois devido a secreção de hormônios durante o trabalho de parto a descida do leite materno é mais rápida no parto do que na cesariana. No parto, a prevalência de desconforto respiratório do recém-nascido é menor que na cesariana, de modo que no caso de uma cesariana eletiva (marcada) esta deverá ocorrer com 39 semanas de idade gestacional ou mais, conforme Resolução do Conselho Federal de Medicina, para que se evite problemas respiratórios no nascituro.
É possível ter um parto normal humanizado ou com redução de dor por meio de anestesia?
Dra. Maristane – O parto normal é uma consequência fisiológica da gestação e a dor faz parte da fisiologia do processo. Existem meios não farmacológicos para alívio da dor como caminhar, massagens ou chuveiro morno na região lombar; ou meios farmacológicos que incluem a analgesia no parto, uma anestesia leve somente para sedar a dor sem sedar completamente a prensa abdominal da paciente para o momento do parto. Deve-se considerar o momento de indicar a analgesia e a ausência de contraindicações para a mesma.
(Por Giordanna Benkenstein Vallejos)