Fonte: Agência O Globo
É como entrar na floresta, pela terra e pelo céu. Se você pensa que esta é mais uma exposição do fotógrafo Sebastião Salgado, engana-se. “Amazônia” — exposta agora em outubro simultaneamente em Paris, Roma e Londres — é um tributo a nossa maior riqueza ambiental. Intocada. É também uma descoberta, jamais vista antes, de montanhas e “rios voadores” amazônicos, duplicados por reflexos.
Na penumbra, 200 fotos, em todas as nuances de preto e branco, nos transportam para uma terra feita de vegetação e água, de nuvens e umidade. Muitas fotos parecem flutuar no espaço, penduradas no teto por fios transparentes. Os sons amazônicos das aves, dos animais, das folhas e dos temporais foram obtidos no Museu de Etnografia de Genebra para inspirar e enriquecer a sinfonia original composta por Jean-Michel Jarre. A trilha da floresta ajuda a transformar “Amazônia” numa experiência quase mística e religiosa. Nos sentimos pequeninos diante da Natureza, exuberante e grandiosa. Não é clichê. Os fachos de luz que atravessam as nuvens lembram a presença de Deus — até para quem não tem fé.
As imagens foram registradas em quase sete anos de viagens de Salgado, com a ajuda dos helicópteros e aviões do Exército brasileiro. Foram ao todo 48 viagens, do início de 2013 ao fim de 2019. O artista e ambientalista é profundamente grato à ajuda logística dos militares, que aceitaram que ele viajasse nas aeronaves, muitas vezes de porta aberta com suas câmeras e seu equipamento. O Estado-Maior do Exército brasileiro tem a maior presença dentro da Amazônia: 23 quartéis, o que possibilitou essa longa expedição de Salgado.
Em live do Conselho Nacional de Justiça, no mês passado, Salgado apresentou 200 painéis fotográficos da exposição (com reprodução vetada no YouTube) e fez um relato de seu trabalho.
– Pude pela primeira vez apresentar a maior cadeia de montanhas do Brasil, a Imeri. Está situada na Amazônia e os brasileiros não conhecem. A Amazônia não é só a grande planície em que os rios serpenteiam no meio. São os rios aéreos. Essa coisa maravilhosa que garante a umidade em toda a área agrícola do Centro-Oeste e do Sul do Brasil, Uruguai, Paraguai, Argentina. Esses rios voadores levam um volume de água colossal para o planeta inteiro. Não podemos perder a Floresta Amazônica. Ela é generosa, ela doa para todos.
Um dos méritos é a cenografia, a montagem. Quem dá a última palavra é Lélia Salgado, há 57 anos mulher de Tião, como o chama.
— Minha ideia foi reproduzir a harmonia desse lugar muito especial. A Amazônia é linda. Cada museu permite uma montagem diferente. Escolhi a penumbra, deixando só as fotos iluminadas. Criei ocas, longitudinais e uma redonda. Usei paredes vermelho ocre, cor da terra. O resto é pintado de cinza escuro. O teto é preto, para desaparecer. Queríamos exibir a Amazônia intocada, viva. Chamar atenção para a maior reserva de água doce, a importância do oxigênio para o planeta.
No Brasil, a exposição chega em 2022: está prevista para fevereiro, no Sesc em São Paulo, e julho no Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro.