“Se não chover logo, só Deus sabe o que vai ser do futuro do agricultor”
Alcindo Berlitz tem 52 anos, nasceu no Travessão Rübenich e é agricultor “de nascimento”. Vinte anos atrás, na esteira de um projeto de desenvolvimento do Turismo Rural, criado pelo ex-prefeito Juarez Stein, Alcindo fez diversos cursos do Sebrae e abriu o Colha e Pague, na propriedade que já vem de seu tataravô, um imigrante da Alemanha que veio para o Brasil em busca de vida melhor.
Esse Colha e Pague resistiu até hoje. E segue sendo o grande centro da atenção turística do Turismo Rural em Dois Irmãos. Especialmente em sábados, pessoas de toda Grande Porto Alegre vão para lá, observar a “vida na colônia”. Vão ver de perto porco, gado e galinha viva. E também conhecem e aproveitam uma grande horta. Horta na qual podem colher e levar para casa repolho, brócolis, couve-flor, tomate, cenoura, alface, rúcula, laranja, limão e todo tipo de legumes que existem numa área de olericultura. Junto ao Colha e Pague, existe uma “Venda”, ao estilo antigo, bem colonial, onde se encontra produtos dali mesmo, como leite, salame, linguiça, queijos e outras coisas.
Para cuidar desse empreendimento rural, erguido nos 17 hectares que compõem a propriedade da família, Alcindo conta tão somente com os braços dele mesmo, os da esposa Vanice e os da mãe Jerônima, que cuida da casa enquanto o filho e a nora trabalham na propriedade. Alcindo viu este ano algo que nunca tinha visto: uma seca de secar árvore no mato. Seca de acabar com os açudes. Seca de matar pé de laranjeira e limão. “Eu acho que nem meu avô viu uma coisa dessas que está ocorrendo agora”, diz Alcindo.
Ele começa a andar e vai mostrando ao Editor do Jornal Dois Irmãos, Alan Caldas: “Olha aquele eucalipto”, diz ele, apontando para a árvore, “está morrendo. Nunca vi eucalipto morrer num pé no meio do mato”. Ele vai caminhando pela propriedade e para no meio do mato. Vê um pé de limão e diz: “Olha isso: o chão está lotado de limão que caiu, e se chacoalho um pouquinho o galho... Olha só, tudo caindo”. E não cai só a fruta, antes do tempo, caem também as folhas. E cair as folhas é, para o agricultor, um signo de que a árvore “vai morrer”.
Alcindo vai caminhando morro acima, para chegar noutra área de plantio, e lá o sol vem fazendo inclemente a sua devastação. “Olha esse brócolis”, mostra ele, “não nasceu. Olha esse alho-poró: deveria estar três vezes mais alto. Veja só o pulgão tomando conta dessa couve-flor: falta água e os bichos se esbaldam”. Ele chega no matinho ao lado e encontra um pé de laranja do céu. Praticamente todas as frutas caídas pelo chão. Ele toca no pé sem força e já dezenas caem como que por encanto. “É algo que nunca vi”.
A seca não começou “ontem”.
Alcindo diz que passou a sentir o perigo lá em novembro e dezembro do ano passado. “Foi quando deu as últimas chuvas boas e aí parou de chover e começou a só dar garoa”, diz ele. E o que é uma “chuva boa”, Alcindo? “É quando se tem dois ou três dias de chuva lenta e constante, que vai aos poucos enchendo os arroios e açudes, isso é uma chuva boa”.
Alcindo ainda consegue colher alguma coisa.
“Mas se não chover imediatamente, não sei o que será daqui a dois meses”, diz ele. A preocupação com o agora é para o futuro próximo, pois ele planta e colhe em dois meses, e agora não consegue plantar nada porque falta água. A água do Colha e Pague vem dos açudes que Alcindo fez na propriedade e de poços artesianos. Mas neste ano os açudes secaram e o poço não consegue irrigar tudo. Alcindo vende só no local, mas sabe que os agricultores todos estão sofrendo o mesmo que ele, “e se não der para plantar e colher, imagina só o que vai ser a subida nos preços”, comenta. Quando o preço sobe no mercado é justo quando o consumidor sente no bolso o que a terra sente quando o tempo é seco e não permite plantio e colheita.
(Por Alan Caldas - Editor)