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A Paróquia São Miguel de Dois Irmãos lançou uma cápsula do tempo para ser aberta daqui a 50 anos. Não custa imaginar...
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Vivo ou morto, 2072 será o ano do meu 92º aniversário de nascimento.
Anotem na agenda: 25 de junho – se houver festa, estão todos convidados. Provavelmente será na sede do instituto que ainda hei de fundar dedicado ao niilismo, ao nada absoluto. Sei que hoje em dia muitos já vivem disso nas redes sociais, mas o meu NADA vai ser TUDO menos isso. Confesso que ainda não comecei a desenvolver a ideia, o que já é um bom começo. E adianto que nada do que disserem será capaz de me demover; pretendo não mover uma palha na direção contrária. (Até porque, se der errado, não há de ser nada.)
Deixando a brincadeira de lado...
Até lá, quantas guerras ainda teremos, quantas pandemias mais viveremos? Pelo histórico, é quase certo que muitas das promessas a serem feitas na campanha que se aproxima ainda não terão sido cumpridas em 2072. Nem eu posso prometer que a minha festa será presencial, pois habituamo-nos, neste início de década, à virtualidade das relações e encontros – o que, para muitos, transformou-se em doce conveniência. A verdade é que é difícil prever o que está por vir, principalmente em termos de tecnologia. Metaverso? Teletransporte? Quem sabe humanoides com um senso de humanidade mais apurado que o dos próprios humanos? (Não sei! Não faço ideia!)
Por ora, apenas parvos devaneios.
O futuro se apresenta no presente como um balaio de perguntas, cujas respostas vão se desprendendo com o tempo em forma de cápsulas. Imaginar como será o mundo daqui a 50 anos – como seremos, se ainda seremos – é no mínimo um bom exercício de autoanálise, faz o pensamento se desdobrar para além da realidade na tentativa de tocar o que a consciência nem sempre alcança. Certamente a realidade será outra no distante ano de 2072, mas talvez muitas das nossas esperanças e desejos permaneçam. (Quem viver, verá!)
O que eu desejo?
Particularmente, quero crer na evolução espiritual. E que a nossa fé resista e se fortaleça.
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INSTANTE NA ESTANTE
Pela vida afora, acumulei algumas observações. São intuições. Quando temos muitas certezas sobre o nosso modo de agir, em cena ou na vida, corremos o risco de ficarmos circunscritos a uma técnica que nos imobiliza naquele processo domado, dominado, que nos congela. É a ponte com o imprevisto, o improvável, o absurdo que, muitas vezes, nos leva a renascer. No palco, atingir o impensável é fundamental. Essa é a batalha.
Os atores têm uma herança oficiosa, subliminar, de transferência na aprendizagem que nos liga através dos tempos – um ator que viu outro ator, que trabalhou com outro ator, que antecedeu a outro ator, que foi discípulo de mais outro e, antes, de muitos outros e outros. Trago em mim e conservo gestos, entonações, sentimentos de atores que vi pela vida. Daqui a cinquenta, cem anos, alguém estará em cena de posse de um gene no DNA de um ator contemporâneo. E essa herança sempre está ligada ao experimento. E ao que fala ao seu instinto.
Respeito todo tipo de encenação, da mais acadêmica à mais contestadora, mas, sentada na plateia, o que me envolve sempre, em primeiro lugar, são os atores. É neles, em nós, que está o teatro.
Prólogo, ato, epílogo – Fernanda Montenegro (1929) com Marta Góes