Por Alan Caldas – Editor
Estava transmitindo a Missa de Páscoa, no domingo, com apenas 7 pessoas: eu filmando, mais o padre Dirceu, o acólito Sandro, o coroinha Vini e mais os três da liturgia, Anderson, Rodrigo e Manu. Sete, somente. Tão somente sete naquele templo imenso em largura, comprimento e altura, e totalmente vazio.
O aroma do incenso sendo aspergido pelo acólito. Aquele som de missa, fazendo “loopings” no teto e voltando em ondas aos nossos ouvidos. O sol como um Espírito Santo entrando pelos vitrais. Uma música em tom baixo. O tilintar das sinetas do coroinha. Uma solidão de outros tempos se apossava de todos ali, eu conseguia ver.
Um ambiente medieval me veio à mente. Uma paz do outro mundo tomou conta de mim. Fiquei pensando em nós 7 ali e outras milhares de pessoas do outro lado, nos assistindo.
Envolvido naquele silêncio, aroma e sons, comecei a imaginar: quem sou eu, realmente? O que faço aqui? Qual a razão de ter vivido esta vida? Por que fiz tudo que fiz? Por que deixei de fazer o que não fiz? Com qual propósito aceitei trazer, através de mim, mais dois de mim a este mundo? Lembrei meu pai, minha mãe, meus irmãos e irmãs, meus avós, bisavós e todos que pude lembrar. Pensei em Adão e Eva e a perda do Paraíso, enquanto me envolvia aquele divino som de Missa e aquele aroma incrível do incenso ia tomando conta do presbitério em que todos nos encontrávamos.
Por um instante, só por um instante, deixei a câmera filmando e fiz um giro lento de 360 graus naquela dita casa de Deus. Então me veio a sensação de que o peso de Deus em nós é o nosso cérebro. Percebi que Deus pesa sobre mim na minha capacidade de ver e de pensar, mas, sobretudo, Deus pesa sobre mim na capacidade que Ele me deu de pensar lógica e ilogicamente. As opções raciocinadas corretas e incorretamente, são o peso de Deus em nosso existir.
O cérebro pensante é o peso de Deus sobre nós, porque, sem essa “coisa” pensante que temos, não haveria diferença entre nós e qualquer outro animal. Sem isso de raciocinar, eu não conteria o mundo, eu pensei. Sem esse cérebro eu seria apenas contido pelo mundo, como qualquer outro animal bruto, cuja finalidade na cadeia da vida é se alimentar e reproduzir. Ou como qualquer outra parte da natureza, que cumpre a sua razão de “ser” sem se questionar sobre os fatos do mundo.
Fiquei por instantes absorto nessa catarse, enquanto a missa transcorria. Fiquei pensando no peso de Deus sobre nós e o quanto isso significa no curso de uma existência que surge e some, na maioria das vidas sem deixar grandes rastros.
Foi um momento especial, aquele. Olhei para nós todos, ali, cada um em seu mundo de expectativas e fé, todos os 7 solitários, encubados numa bolha e nos dispondo a levar para outros que nos assistiam aquela sensação protetora e esperançosa que vinha daquele momento litúrgico.
Por um instante, só por um instante, não mais que um instante, olhei para todos nós 7 envolvidos naquele ritual de esperança, gratidão e fé, e me perguntei:
- Onde estão as asas?