Editor Alan Caldas e o enólogo Philippe Coulon, na cidade de Epernay, na região de Champagne, França, durante entrevista em 2008 para o Jornal Dois Irmãos
Desde que os italianos chegaram ao Rio Grande do Sul, lá pelo final dos anos 1860, o plantio de uva se tornou uma constante na serra gaúcha. E a produção de vinho, também. Um vinho com a uva que se tinha. Via de regra a Isabel. E com grande produção em cada hectare plantado. Um vinho “colonial”, como passou a se chamar e se beber em todas as famílias.
No século seguinte, já agora nos anos de 1970, a empresa francesa Moet & Chandon decidiu abrir uma filial em Garibaldi. E para coordenar a implantação dessa gigante francesa produtora de vinhos e champanhe, veio para o nosso estado um diretor francês, Philippe Coulon.
Quatorze anos atrás entrevistei Philippe Coulon em Epernay, na França, onde está a sede da Chandon na região de Champagne. Ele havia se aposentado e voltou para onde começou sua vida de enologia.
Philippe me contou que quando chegou a Garibaldi, saiu procurando as videiras e estranhou que eram todas plantadas morro abaixo, o que implica em diferentes micro-climas que acabam perturbando a produção da uva.
Ele também disse que naquela época não se produzia no Brasil um vinho de alta qualidade, e a razão era que não haviam as uvas necessárias para isso. Então ele e a Chandon trouxeram para cá mudas de praticamente todas as uvas varietais necessárias à produção de um vinho.
Com as mudas em mão, Philippe passava de colono por colono e doava as uvas. Ensinava direitinho os cuidados e técnicas para plantar aquelas varietais tão sensíveis e desconhecidas pelos colonos italianos. Por fim, ele se comprometia a adquirir a uva na colheita, afim de produzir um vinho fino através da Chandon.
Assim começou a história que tornou grande o hoje Vale dos Vinhedos. Mas Philippe Coulon infelizmente quase nunca é lembrado, embora, a meu ver, ele merecesse uma estátua na entrada do Vale dos Vinhedos.
Ele trouxe também para o Brasil, a primeira prensa mecânica. Mas o trabalho árduo, dureza, mesmo, foi fazer os produtores aceitar a ideia de que é preciso ralear a uva no pé. Que não dá para produzir dezenas de milhares de quilos por hectare e fazer um bom vinho. É preciso cortar fora a maioria das uvas e deixar apenas alguns poucos cachos, para que a planta absorva o terroir ao máximo e fique o que se chama de “superior”.
A Chandon produziu seu primeiro vinho brasileiro em 1973. Era a glória! Mas infelizmente não conseguiu vende-lo. É que uma enzina até então desconhecida pelos enólogos atacou as uvas e o vinho ficou com um amargor que impossibilitava sua venda. Philippe e seus colegas enólogos e químicos avaliaram essa enzina durante 6 meses nos laboratórios da Chandon, na França, e finalmente conseguiram bloqueá-la, fazendo, então, no ano seguinte, o primeiro vinho de qualidade superior que o Brasil até então não tinha. Salut!
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Editor Alan Caldas e o enólogo Philippe Coulon, na cidade de Epernay, na região de Champagne, França, durante entrevista em 2008 para o Jornal Dois Irmãos