Por Alan Caldas – Editor
O mais triste agora são as pessoas idosas.
Trabalharam 40 anos e se aposentaram. O que lhes resta?
Resta ir na praça ver amigos. Jogar canastra com a turma. Tomar café ou chá delicioso na casa de alguém. Participar do bailinho dos clubes de terceira idade. Fazer uma excursão. Visitar parques. Fazer amizades que a vida de trabalho duro não permitiu fazer, porque quem trabalha não tem tempo para construir amizades sólidas. Viver, enfim, agora, o que não tiveram tempo de viver durante o longo período de trabalho.
Resta aos idosos o maravilhoso convívio com os netos. Uma comidinha especial para eles. Uma brincadeira. Um passeio pelas ruas. Umas mágicas. A ida no parquinho ali da praça. Coisa que criança adora e que tanto alegra os avós. Resta o abraço no netinho e na netinha, a alegria incrível de ver filhos dos nossos filhos começando a fantástica caminhada que é a vida.
Avós são pais com açúcar. A eles não compete educar e, sim, amar, amar e amar os que vieram ao mundo através dos filhos que eles colocaram no mundo. Lembro que quando levava o Adam lá em Ivoti, para ver o seu Jacó e a dona Carmem, eu sempre dizia, brincando:
- Vou deixar ele aqui por três horas, e podem estragar que depois eu conserto.
Avós mimam, avós dão bala, avós fazem as vontades e avós são tudo de bom para os netos justamente porque a responsabilidade de educar não é deles. A responsabilidade deles é amar, amar e amar. E fim!
No entanto, diante desse infame Covid-19, os idosos passaram a ser vistos como “seres perigosos”. Isso é uma insanidade sem precedentes. É um pesadelo maior do que esse vírus. E a toda hora estão dizendo:
- Não vá no vovô e na vovó. Não chegue perto do vô e da vó. Não abrace. Não beije. Não toque.
Mantenha distância dos idosos.
Patologicamente, compreendo isso. Com esforço. Mas compreendo. Porém, humanamente não compreendo. E quero dar um alerta, aqui, sobre a “comunicação” que esse “afaste-se dos idosos” vai causar na alma dessas pessoas amadas que agora estão sendo repelidas como se fossem pragas pestilentas.
O alerta é o seguinte:
Os idosos viveram uma vida de trabalho. Construíram tudo que nos cerca. E, agora que podem ter a alegria do convívio com amigos e descendentes, estão sendo proibidos disso. Essa proibição é tão medonha, que nem no Inferno deve ter um suplício tão grande. Até porque, Lúcifer também é velho.
O que estamos fazendo com os idosos vai causar uma tristeza profunda neles. Os idosos vão suportar, é claro, porque já viveram bastante e quem vive bastante aprende a dobrar a espinha. Acatarão a ordem. Mas, ficará neles essa marca dolorida de que não são o pai ou mãe amados e dedicados que sempre foram.
O que ficará no pensamento dos idosos é que são “um perigo”. Um estorvo. Um produto descartável da sociedade familiar (e comunitária) que eles próprios deram seu suor para erguer e que agora os escorraça. Isso é perigosíssimo para o emocional dos idosos.
Esse sentimento de tristeza profunda poderá evoluir rapidamente para depressão, aquela tristeza profunda em que se entra sem querer e não se sai, mesmo querendo. E, se isso acontecer, em alguns meses a partir daqui teremos idosos desistindo da vida por não verem mais razão para viver, e, mesmo, veremos muitos idosos pensando em suicidar-se.
É tristíssimo isso. Me dói profundamente ver crianças, jovens e adultos cheios de razões “se impondo” (às vezes até com palavras grosseiras) sobre seus pais e avós, “mandando” eles ficarem quietos e fechados.
A sociedade humana não está preparada para um vírus. Somos infantes, diante da biologia. Mas muito menos preparada está nossa civilização para entender as razões da humildade da alma dos idosos.
Você sabe por que os idosos são humildes?
Pais são condescendentes com filhos não apenas porque os amam. Pais aceitam de cabeça baixa muitas coisas que sabem ser uma bobagem, porque viveram muito tempo, viram muitas coisas, tiveram grandes experiências e sabem que os filhos “estão aprendendo” a viver. Essa, se você não sabe, é a razão dos pais aturarem tantas imposições dos filhos. Cristo explicou isso divinamente, dizendo sobre seus algozes:
- Perdoai-os, Pai, eles não sabem o que fazem.
Só sendo pai e mãe se entende do que Cristo estava falando.
É triste ver quem construiu tudo que temos, ver quem emprestou seu corpo para que tivéssemos vida, ser agora tratado como leproso por quem ainda nada provou que construirá na vida.
Se você é criança, adolescente, jovem ou adulto, tente olhar seus pais e avós com os mesmos olhos de experiência, humildade e amor que eles olham você. E entenda que a esperança (que é tudo que adultos, jovens e crianças têm) já não é tão grande assim nos avós. O dia a dia dos idosos é mais ou menos como a música do Chico Buarque, que diz assim:
“Deixa em paz meu coração Que ele é um pote até aqui de mágoas
E qualquer desatenção ... faça não! ... pode ser a gota d’água...”
Aperte os velhos, esprema os velhos, humilhe os velhos e eles vão embora. É assim que idoso pensa: já vivi bastante! Eles raramente confessam, mas é assim que eles pensam. E o pior é que ao idoso não é dado o benefício de “os incomodados que se retirem”. Idoso, via de regra, é um prisioneiro da família. Tenha dó.
Meu conselho?
Exerça seu amor AGORA. Não vacile. Vamos fazer, sim, o que tiver de ser feito, em termos de prevenção ao vírus. Mas, por favor: não tente ser arrogantemente inteligente e firme com quem sempre foi e sempre será mais humildemente inteligente e mais humildemente firme que você.
Meu exemplo é trágico:
Meu amado pai morreu abruptamente, aos 78 anos. Falei com ele às 11 da noite, e, às 6 da manhã, minha irmã o encontrou morto, sentadinho numa cadeira.
Fui quase voando para lá. E, quando entrei na casa mortuária e o vi deitado naquele caixão, seu cabelo tão branquinho, seu rosto tão querido e me parecendo sorrir, não conseguia contar as lágrimas e a culpa por ter passado os últimos 3 ou 4 anos “mandando” ele parar de fumar. Aos prantos, me abracei no seu corpo morto e frio e disse baixinho no ouvido dele: “Me desculpa, paizinho querido. Me desculpa, por favor. Me desculpa, me desculpa, me desculpa... eu não sabia o que estava fazendo”.
Eu não sabia, realmente.
Mas aí. . . aí já era tarde. . .
*
Vamos fazer tudo para proteger nossos idosos. Mas, por favor: com o triplo de amor, porque para idoso a solidão do desamor é a porta de entrada para a morte.