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Não temos o costume de parar para respirar. A maioria de nós vive na ânsia pelo próximo passo, na tentativa até certo ponto sufocante e inviável de antecipar o futuro, seja daqui a um dia ou daqui a dez anos. Dificilmente concentramos a totalidade dos nossos esforços neste momento presente, no ponto exato de convergência entre o que não é mais e o que será logo ali, quando o ponteiro se desfazer de outro minuto ou de outra vida.
A brincadeira entre expectativa e realidade é sintomática.
Muitas vezes preferimos tão somente expectar um desejo sem se ater à leitura do momento e suas circunstâncias. Somos dispersivos, displicentes, ausentes de si mesmos; deixamo-nos levar pelo movimento do entorno, alheios ao próprio movimento. É a tal praticidade de seguir o fluxo, desconsiderar a individualidade, atenuar o peso da culpa diante da possibilidade de fracasso.
Não temos o costume de parar. Somos treinados, desde pequenos, a não dar espaço ao silêncio, a não prestar atenção na ausência de barulho e o que ela tem a dizer. Sob o pretexto de uma sensação – falsa, na maioria das vezes – de movimento e segurança, preferimos o grito, o atropelo, o sufoco, a respiração ofegante e rarefeita. Assim, raramente consideramos ou percebemos as entrelinhas, a visibilidade do que não precisa ser dito.
E o que exatamente não precisa ser dito? Difícil dizer...
Por mais universal que seja um conceito, seu entendimento é algo particular. Ou então não estaríamos discutindo (ainda) o benefício da vacina contra a Covid-19, para ficar num exemplo próximo. Que dirá tendo que reiterar a ojeriza às atrocidades do nazismo ou às infâmias de qualquer tipo de preconceito. Infelizmente, além de ditas, há muitas coisas que ainda precisam ser ilustradas de tempos em tempos.
(O problema é que não temos o costume de parar para respirar e ouvir.)
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INSTANTE NA ESTANTE
“No começo de 1973, o New Musical Express preparou uma lista dos dez astros do rock and roll que estavam mais perto da morte e me colocou em primeiro lugar. Sou também o Príncipe da Escuridão, o homem mais elegantemente desperdiçado do mundo, e coisas assim – apelidos que ficaram grudados em mim foram cunhados naquela época e continuaram para sempre. Naquele período, sentia muitas vezes que havia gente desejando a minha morte, mesmo alguns bem-intencionados. No começo, eu era uma novidade. Mas é sempre isso o que pensam sobre rock and roll, mesmo na década de 60. E então passaram a querer que você se fodesse. E depois, como eu não me fodi, passaram a querer me ver morto.
Fui o primeiro daquela lista durante dez anos! Ela costumava me provocar gargalhadas. Foi a única lista em que fiquei no primeiro lugar dez anos seguidos. Sentia uma espécie de orgulho por aquela posição. Não creio que alguém tenha mantido aquela posição tanto tempo como eu. Fiquei desapontado de verdade quando comecei a cair na lista. Finalmente, me despacharam para a nona posição. Ai, meu Deus, já acabou.”
Vida – Keith Richards (1943) com James Fox (1945)