Por Alan Caldas (Bagnole del Trigno - Itália)
Ontem, paramos em Bagnole del Trigno. Só moram 877 pessoas ali e cada um sabe tudo da vida alheia.
Tem uma pracinha e nessa pracinha vi senhores jogando carteado em enorme gritaria.
Me aproximei. A barulheira parou. Me apresentei:
– Buongiorno. Sono un giornalista brasiliano. (Bom dia, sou brasileiro e jornalista).
Todos sorriram e disseram:
– Benvenuto, giornalista brasiliano. (Bem-vindo jornalista brasileiro)
E a gritaria voltou. Fiquei observando a alegria e simpatia de cada um.
Olhei os que ao redor admiravam o jogo. Lembrei de lugares em nossa cidade onde aposentados vão para ver amigos, tomar aperitivo ou jogar carteado como esses adoráveis senhores aqui de Bagnole.
Já me sentindo “em casa”, sentei. E, no final da partida, que é rápida, perguntei:
– Che gioco è questo? (Que jogo é esse).
– Questa è la treccetta. (Se chama tressette, disseram).
Começou nova partida. Cartas distribuídas. Uns com mão boa sorriam. Os com mão podre reclamavam.
Tentei entender, olhando o vizinho. Mas as cartas desse jogo não têm números nem ás, valete, dama ou rei. São apenas figuras que nunca vi.
– Vuoi fare un gioco, brasiliano? (Quer jogar uma partida, me perguntaram alegremente).
Agradeci é claro. Mas pedi para filmar a partida seguinte. E eles responderam em grande vucciria (algazarra), dizendo:
– Fagli sapere che Pepe è vedovo e vuole risposarsi. (Claro, mas avise que o Pepe está viúvo e quer casar de novo).
Bgnole del Trigno é um lugarzinho lindo. Bem no alto. Ruas apertadíssimas, medievais. Rochas e paredões que permitem visões espetaculares do vale lá embaixo. Tem essa pracinha encantadora com flores, música, uma bica (nasone) para se beber água da terra e voltar. Tem um Memorial em homenagem às dezenas de jovens dali mortos na segunda Guerra.
Tem mercados, lojinhas, cafeterias e bar. Mas o que Bagnole e qualquer cidade no mundo tem, realmente, de muito atraente, é a cultura popular.
E, para conhecer isso, para saber e “ver” a alma do povo, é preciso interagir com ele. Falar com ele. Sentar com ele. Ouvir ele. Se envolver com ele.
Aí você pode dizer que “viajou”!
Me despedi dos “bagnolenses”:
– Ciao, amicos.
– Ciao giornalista brasiliane, arrivederci (responderam sorrindo).
Arriverdeci, respondi, sorrindo também.
E, já me afastando, ouvia a gritaria deles, falando sobre o fato que certamente narrarão em casa para as esposas (menos o Pepe, que é viúvo) assim como estou narrando para vocês.