Por Alan Caldas (Do Cairo - Egito)
Fomos ao Khan El Khalili. É o mercado mais famoso não só do Egito. É o mais famoso de todo o Oriente Médio. Foi criado no ano de 1382, pelo sultão el-Jalili, como local de descanso para comerciantes. Mas cresceu. Se tornou imenso. E hoje está no coração da enorme cidade do Cairo, que é a capital egípcia.
A vizinhança que cerca o mercado El Khalili tem um impressionante ar medieval. Tudo é cor de areia e telha. Tem prédios centenários com rebuscada e linda arquitetura mameluca. Tudo ali parece antigo. Parece velho. Parece até assustador em alguns becos e costumes. Mas é apaixonante. E para quem tem a alma livre para o conhecimento e interação sem preconceito com as diferentes culturas, é sem dúvida encantador esse mercado e sua vizinhança.
Lojas dizem que são “apenas” 900 e poucas no mercado. Uma ao lado da outra. Coladinhas. E então parecem ser milhares. O mercado tem uma rua “eixo”. A principal. E tem dezenas de ruelas, algumas sem saída e todas estreitíssimas. O barulho é constante lá dentro. Tem música. Tem ruídos de canto. Tem vozes. Tem anúncios. Tem milhares de pessoas indo e vindo e olhando e perguntando. Tudo isso gera um vai e vem intenso e quase inacreditável. Alguns comerciantes passam com enormes quantidade de produtos. Outros de bicicleta. Tem os que vendem tábuas inteiras de pão egípcio. E os que vendem suco, café, chá, doces.
Um lindo menino egípcio de talvez 10 anos carrega seu tabuleiro com produtos como os baleiros de cinema. Me sorri. Vejo meu filho Benício nos olhos queridos dele. Lhe compro um doce. Ele se ilumina. Me sorri e me dá um abraço carinhoso. Meu coração de pai dispara de tanta saudade. Fiquei iluminado.
Seguimos andando.
Muitas mulheres com burka total vêm e vão. Só os olhos de fora. É por querer. Não é obrigação. É a cultura islâmica. Todas as outras mulheres estão com lenços cobrindo a cabeça. As ofertas se multiplicam. Tem loja de roupa. De sapatos. De perfumes. De instrumentos musicais. De especiarias. De carne. De legumes. De luzes e lustres. De ferragens. De comida prontas. De souvenirs. De jogos. Tem bancos. Tem tudo de tudo.
E, no lado de fora, tem o trânsito mais agitado que já vi. E todos ali têm regra própria. É buzinada o tempo todo. E gritos. Os carros, motos, caminhões e ônibus têm de disputar centímetro a centímetro com centenas ou quem sabe (porque é impossível contar) milhares de ambulantes que expõem seus produtos na calçada, no meio da rua, no jardim entre as duas ruas, em cima dos carros, ou onde der. E a buzinada segue, incessante. E seguem os gritos, os risos e muitos bate-boca que não são brigas e sim “negociações” para acerto de melhor preço a receber ou a pagar.
Todos usam roupas típicas desta região. E a Angela também se vestiu com lenço na cabeça e tudo mais. O país é fortemente islâmico e tem de cuidar para não ofender a cultura deles. Vestida assim, a Angela passava quase como “local”. Misturava-se às milhares de mulheres islâmicas. Mas eu, alto e branco, não tinha como me misturar. E todos nos paravam. Nos chamavam em inglês, espanhol, francês, russo, italiano, tudo que é língua, nos pedindo para entrar e olhar o produto da loja.
São sorridentes, os egípcios e egípcias. Gente muito gentil. São de uma delicadeza sorridente que é de impressionar. Uns passavam e sorriam. Os jovens e crianças piscavam para nós. Acredita nisso? Era uma graça. Passavam, paravam e piscavam. Nós piscávamos de volta e saíamos sorrindo. Eles sorriam também. Uma hora chegaram duas mocinhas islâmicas e seu irmão, de nome Mohamed. Ele me perguntou em inglês se poderiam tirar uma foto comigo.
– Comigo? Uma foto? – perguntei.
Sim, eles disseram. Estavam com as mães. Fizemos a pose e eles fotografaram, abraçados em nós. Nós fotografamos também e eles ficaram numa felicidade inexplicável. Não paravam de agradecer e desejar sorte e saúde. Um outro senhor nos viu andando por numa ruela e em inglês disse para irmos ver as especiarias no Bazar antigo, que fica numa daquelas ruelas. Agradecemos. Mas ele disse:
– Não, não, eu vou levar vocês lá.
E se foi conosco. Passamos numas 30 lojas, e eles nos fazendo testar especiarias que estavam nas lojas. Ele conhecia todo mundo. No fim perguntamos o que vendia a loja dele. Sou fabricante de óleos essenciais, ele disse. E pedimos para ver. A loja é pequena como todas as outras, mas lotada de essências do chão ao teto. Ele explicou que é no Egito que se fabricam as essências que se tornarão perfumes de marcas como Chanel, Gucci, Calvin Klein, Victoria’s Secret, Rocheau e tantas outras. Nos mostrou os óleos que tem na loja dele e que são a base para perfumes famosos. Nos serviu chá. Ficou feliz da vida. Nos apresentou para todos naquela área. Ficamos impressionadíssimos.
Na saída e já bem longe do Bazar, paramos para comprar água. O Egito é tão seco que você desidrata respirando. Na loja estavam dois senhores comendo num prato enorme. Me olharam e do nada nos convidaram para sentar um pouco e comer com eles. Já viu isso? Eu nunca. Voltamos feliz da vida para o hotel.
Que dia!
Quanta cultura diferente. E quanto respeito, segurança, delicadeza e simplicidade se vê nesse povo. Não é à toa que eles são a civilização mais antiga do planeta. Em 6 mil anos de história eles se tornaram essa graça de seres humanos.