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Que maravilha! Todo mundo com (sua) razão e ninguém se ouvindo.
Como cantava o saudoso Bezerra da Silva:
Para tirar meu Brasil dessa baderna
Só quando o morcego doar sangue e o saci cruzar as pernas
Dizer o que se pensa não significa necessariamente pensar no que se diz. As palavras estão no ar, mas poucos sabem apanhá-las – a maioria apanha delas. Às vezes atropelamos as palavras, outras tantas somos atropelados por elas e por sentimentos pouco sensíveis. A estupidez se basta e não se reconhece, a não ser na projeção de si mesmo no outro. O que eu quero dizer com isso? Boa pergunta...
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(Eu só sei que...)
Certamente haverá consequências, mas não convém procurar culpados – pelo menos não agora. Se houve exageros, o tempo dirá.
Por ora, o apaziguamento se faz necessário. A ordem será restabelecida aos poucos, por conveniência da imprevisibilidade de qualquer trauma. Ensinamentos serão muitos e variados, o que exigirá uma capacidade de discernimento ainda mais intrincada. Antes disso, há de se apascentar a ira.
A maioria das respostas nos escapa em momentos cruciais, apesar das perguntas serem as mesmas de outrora. Mudam os personagens, e justamente neste ponto da trama perdemos pontos de vista que antes nos eram favoráveis. Quando o holofote apontado ao outro nos alcança, somos impelidos a agir através da falsa expectativa que recomendávamos sem pudor, esquecendo e duvidando dos próprios conselhos. (Faça apenas o que eu digo!)
De certa forma, somos todos atores frustrados da vida real, lugar onde a dor não é cenográfica, a morte não deixa de existir quando a cena se encerra e o final da história nem sempre (ou quase nunca) é feliz. Querer mais não pode significar ser menos, a menos que estejamos dispostos a pagar um preço meramente especulativo, superestimado e de pouco valor. (E o que é pior: a saída de cena tende a ser deprimente.) Certamente haverá consequências. Portanto, antes de mais nada, pondere.
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(Também sei que...)
Para tirar meu Brasil dessa baderna
Só quando o morcego doar sangue e o saci cruzar as pernas
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INSTANTE NA ESTANTE
Ah, como o sangue corre mais rápido nas veias quando meus dedos tocam inadvertidamente os seus ou quando nossos pés se encontram embaixo da mesa; recuo, então, como se diante do fogo, mas uma força estranha me move de novo adiante – chego a ficar meio tonto dos sentidos – Oh, e sua inocência! Sua alma ingênua nem imagina o quanto essas pequenas confianças me castigam! – E quando ela coloca a mão dela sobre a minha enquanto fala e, no calor da conversa, vem chegando mais perto de mim, a ponto de eu poder sentir em meus lábios o alento sublime que emana de sua boca. – Ah, aí eu vou a pique, como se atingido em cheio por um relâmpago. – E, Wilhelm! Se um dia eu me atrevesse, esse céu, essa confiança –! Você entende o que eu quero dizer. Não, meu coração não está tão perdido assim! Fraco! Apenas bastante fraco! – E isso já não significa estar perdido? –
Para mim, ela é sagrada. Todo desejo parece calar em sua presença. Nunca sei o que acontece comigo quando estou com ela; é como se minha alma revirasse, aflorando o avesso dos meus nervos.
Os sofrimentos do jovem Werther – Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832)