Por Alan Caldas – Editor (De Madri, Espanha)
Quando comecei a viajar pela Europa, lá nos anos de 1980, os trens eram o transporte oficial. E magníficos! Na época, cada país tinha sua moeda, e para facilitar o câmbio se viajava com traveller’s check.
Na Europa de então, traveller’s e trens eram instituição. Se comprava uma espécie de ticket mágico. O mesmo que temos hoje para metrô e ônibus, em Paris, Madri e outras capitais. Naqueles anos, um ticket do trem facilitava a vida do viajante. É que viajar sempre foi caro. Mas, o MAIS CARO era (e seguirá sendo) a necessidade de DORMIR.
Pouso já era custoso na Europa dos anos 80. E justo aí aparecia a “magia” do trem naqueles anos. Esse ticket do trem ao qual me refiro, podia ser comprado para uma semana ou 1 mês. A jogada era comprar por 1 mês. Valia para “toda” a Europa que não cruzasse a barreira do Leste, onde estava a magnífica Rússia, sede da fechada (e linda) União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, a URSS, que pessoas assustadas chamavam de “o perigoso (Kkk...) mundo comunista”. Para aquele lado não se ia nos trens “normais”. Ia-se pela Aeroflot. Mas, nos demais países, se viajava por tudo com esse ticket. Era uma benção econômica.
A maravilha dele era se ir, digamos, de Lisboa, em Portugal, a Genebra, na Suíça. Ou onde você quisesse. Se estava em Berlim, por exemplo, e ficava lá o dia todo, quando chegava a noite ao invés de gastar em hotel você ia até a Hauptbahnhof, a estação central de trem, pegava um com cabine. Tinha cama na cabine. Você dormia andando “nos trilhos” e de manhã acordava em Paris.
Entendeu a magia?
Era incrível, aquilo.
Quando anoitecia em Paris, você ia até a Gare de Lyon ou a Gare du Nort, e pegava o trem para Madri, por exemplo. Ia dormindo. E chegava lá na manhã do dia seguinte. Dali ia para Lisboa. Ia para onde quisesse. Só raramente se gastava em hotel. E se conhecia gente nova a cada estação. A vida era efervescente. Novas ideias. Novos conceitos. Pessoas novas a cada dia. Tudo muito vivo na juventude de então. Vivo e lindo.
Era mágico aquele ticket de trem. Havia 6.886 quilômetros de malha ferroviária, e você cruzava de Leste a Oeste e de Norte a Sul a Europa “permitida”. Era genial!!!
Então, vieram os anos 90. E veio o fim dos trens com preços subsidiados. A tarifa subiu muitíssimo, inviabilizando a antiga “alegria de viajante”. Agora é mais barato alugar carro, mesmo com o preço da gasolina. Ou ir de ônibus. Os trens evoluíram. Ficaram melhores. Mais confortáveis e rápidos. Mas o preço? Ahhhh, o preço ficou impraticável!
Escrevo isso porque hoje eu e a Angela estávamos passeando por Madri e chegamos em Atocha, a grande estação de trens desta linda cidade. Olhando para aqueles trens ali na nossa frente, senti uma saudade incrível. Revi mentalmente aquele tempo em que, jovem ainda, sem compromisso, sem ontem nem amanhã, cruzávamos a Europa para lá e para cá.
Era como se não houvesse limites. Nem fronteiras. Nem nada para atrapalhar essa aventura incrível que chamamos de. . . vida.